08 janeiro, 2016

Reminiscências da minha infância...

Despacho fofinho

Vem a lembrança de quando era criança,
de quando ia no Ceasa com meu pai e avô.
Caldo de cana, pastel, comilança,
um criador de coelhos, - “ah quero um por favô!”

Um não, mais dois o meu pai me comprou:
- “macho e fêmea, você vai cuidar”,
- “Estou tão feliz, claro que cuidar eu vou!”
- “Claro, prometo, pode acreditar”

Era muito ocupada em brincar com os dois
que não cuidava do que era preciso.
Comida, água, isso podia ficar pra depois,
embora sempre alguém desse o aviso.

Minha avó pois logo assumiu e com rapidez
ficou verdadeiramente de saco cheio
- “Veja a merda que esse coelho fez”,
- “tem sujeira aqui e por todo o meio.”

Um dia meu avô me chamou com um abraço:
- “Netinha querida, nosso quintal é pequenininho,
- os coelhos precisam de mais espaço...
- Um terreno, quem sabe, como o do vizinho...”

- “Eles serão mais felizes e você pode visitar”
- “Certeza, vovô? O vizinho parece ser boa pessoa,”
- “na sua casa sempre tem gente a cantar,”
- “eles serão mais felizes, mesmo que me doa.”

Detalhe que eu não sabia, na época inocente,
era que aquilo era um terreiro de "macumba".
Na primeira visita, um coelho tinha morrido “doente”.
Fiquei chateada e quis em vão ver sua tumba.

Não passou muito tempo e o outro morreu
de um mal muito, muito parecido.
Triste fiquei, mas logo se esqueceu.
A vida seguiu até que eu já tinha crescido.

Fui pensar nas coisas do passado,
em “doenças” tão fulminantes e certeiras.
E embora nunca antes tivesse cogitado,
juntei os fatos e descobri verdades verdadeiras.

Não tenho certeza, mas penso que acho
que sei sobre o fim que os dois pereceram:
meus dois coelhinhos viraram despacho!
Nunca jamais os fofinhos mereceram!

Quem merecia era eu que nunca cuidei,
um castigo, uma sina, uma boa lição!
Nem mesmo por um tempo eu lembrei
que os coelhinhos moravam no meu coração.

Não tenho rancores, só remorso a sentir,
perdoei meus avôs e o vizinho “solícito”
Se prometer cuidar, melhor não mentir.
Responsabilidade é um dever implícito.

Termino aqui essa canção infeliz,
a história banal que findou em tristeza.
Ter animaizinhos eu sempre quis,
mas quem cuida é quem tem a nobreza.


Lucia Helena Sider

Nenhum comentário:

Postar um comentário