Reminiscências
da minha infância...
Despacho
fofinho
Vem a lembrança
de quando era criança,
de quando ia
no Ceasa com meu pai e avô.
Caldo de cana,
pastel, comilança,
um criador de
coelhos, - “ah quero um por favô!”
Um não, mais
dois o meu pai me comprou:
- “macho e
fêmea, você vai cuidar”,
- “Estou tão
feliz, claro que cuidar eu vou!”
- “Claro, prometo,
pode acreditar”
Era muito
ocupada em brincar com os dois
que não
cuidava do que era preciso.
Comida, água,
isso podia ficar pra depois,
embora sempre
alguém desse o aviso.
Minha avó pois
logo assumiu e com rapidez
ficou verdadeiramente
de saco cheio
- “Veja a
merda que esse coelho fez”,
- “tem sujeira
aqui e por todo o meio.”
Um dia meu avô
me chamou com um abraço:
- “Netinha
querida, nosso quintal é pequenininho,
- os coelhos
precisam de mais espaço...
- Um terreno,
quem sabe, como o do vizinho...”
- “Eles serão
mais felizes e você pode visitar”
- “Certeza,
vovô? O vizinho parece ser boa pessoa,”
- “na sua casa
sempre tem gente a cantar,”
- “eles serão
mais felizes, mesmo que me doa.”
Detalhe que eu
não sabia, na época inocente,
era que aquilo
era um terreiro de "macumba".
Na primeira
visita, um coelho tinha morrido “doente”.
Fiquei
chateada e quis em vão ver sua tumba.
Não passou
muito tempo e o outro morreu
de um mal
muito, muito parecido.
Triste fiquei,
mas logo se esqueceu.
A vida seguiu
até que eu já tinha crescido.
Fui pensar nas
coisas do passado,
em “doenças”
tão fulminantes e certeiras.
E embora nunca
antes tivesse cogitado,
juntei os
fatos e descobri verdades verdadeiras.
Não tenho
certeza, mas penso que acho
que sei sobre
o fim que os dois pereceram:
meus dois
coelhinhos viraram despacho!
Nunca jamais
os fofinhos mereceram!
Quem merecia
era eu que nunca cuidei,
um castigo,
uma sina, uma boa lição!
Nem mesmo por
um tempo eu lembrei
que os
coelhinhos moravam no meu coração.
Não tenho
rancores, só remorso a sentir,
perdoei meus
avôs e o vizinho “solícito”
Se prometer
cuidar, melhor não mentir.
Responsabilidade
é um dever implícito.
Termino aqui
essa canção infeliz,
a história
banal que findou em tristeza.
Ter
animaizinhos eu sempre quis,
mas quem cuida
é quem tem a nobreza.
Lucia Helena
Sider
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